Até que ponto os sucessivos governos, neoliberais ou assemelhados, da República Federativa do Brasil podem continuar pondo em risco a segurança do Estado e do patrimônio nacional, desmobilizando e desarmando criminosamente o Exército, a Marinha e a Aeronáutica sem que haja uma insurreição, "de ofício", por parte de seus comandantes, dentro do que prevê a Constituição da República, a Lei de Segurança Nacional e o Código Penal Militar?
Hoje, em nome da "economia", dentre centenas de ações negativas promovidas contra nossas Forças Armadas, chegaram a ponto de interromper a continuidade na formação anual dos nossos contingentes de reservistas, podendo com tal irresponsável ato produzir sérias consequências para a integridade territorial do país se houver necessidade de uma mobilização em caso de guerra.
Em 2003, no tradicional discurso de final de ano feito pelo atual Presidente da República no Clube do Exército para os Oficiais Generais das FFAA. Sua Excelência declarou: "(...) Para que termos um bando de generais? Para que termos um bando de soldados se não temos pólvora, se não temos uma bala se viermos a precisar dela?"
Uma das leituras que podemos fazer desta declaração é a da possibilidade de amanhã qualquer ministro da fazenda, realmente por falta de pólvora em nossos paióis, cortar mais verbas e interromper a preparação das turmas de aspirantes a oficial das academias militares de Agulhas Negras, Pirassununga e da Escola Naval, quebrando, assim, a continuidade na formação de toda a cadeia de comando, que vai dos tenentes aos oficiais generais.
Dentro da lei, o limite acima citado, a ser entendido como Estado de Necessidade, deve obrigatoriamente ter que existir, mas, talvez ainda não deva ter sido atingido, ou se o foi, então, os nossos chefes militares estão deixando de cumprir com suas missões constitucionais.
Em um trecho da "carta" enviada aos generais do Exército em 12 de outubro 2002, pela diretoria da ASMIR-PR – Coronel Oficial de Estado Maior Roberto Monteiro de Oliveira - (Associação do Militares da Reserva do Paraná), podemos ler: "(...) E, se esta nossa avaliação for correta, já estamos perigosamente próximos da situação extraordinária que São Tomás de Aquino e também o nosso Direito Positivo define como Estado de Necessidade, em que todos os fatores adversos atingem um nível de gravidade e complexidade tão agudo que se potencializam entre si, o que tende a engendrar um cenário tão excepcional que dá origem ao chamado Estado de Necessidade, no qual as avaliações, os juízos, os conceitos, as decisões, e até os atos devem estar referenciados a parâmetros de hierarquia superior, filosófica, quase de ordem metafísica, acima, portanto, das normas, regras, valores e até dos princípios normais do Direito Positivo Salus Patriae Suprema Lex.
E esse Estado de Necessidade pode — in extremis — tornar lícita (para alguns até mesmo um dever) a desobediência civil contra o tirano injusto que quer destruir a Pátria (...)".
Foi assim que o ex-ministro da Aeronáutica, o Brigadeiro Werner Brauer, lançou mão deste Direito quando FHC, para humilhar nossas FFAA, nomeou para o recém criado Ministério da Defesa um elemento civil, desqualificado e supostamente ligado a atividades ilícitas no Estado do Espírito Santo. Werner Brauer corajosamente denunciou o ato, mas, desgraçadamente, foi abandonado por seus pares e por isso exonerado.
Entretanto, mesmo sozinho atingiu seu objetivo. Lavou a honra da Forca Aérea e "abateu" o impostor.
Em 1982, pelo que ficou estabelecido nos termos do Consenso de Washington, além da criação do Ministério da Defesa, da submissão do Brasil ao Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis, etc., o tanque de combate EE-T1 Osório, desenvolvido pela extinta Engesa S/A, importantíssima indústria de viaturas militares blindadas e de transporte que fazia parte do emergente complexo industrial militar brasileiro, é um dos melhores exemplos para se denunciar esta política que submete nossas FFAA ao contínuo desarmamento e a dependência da boa vontade de governos estrangeiros para o fornecimento, através das Comissões Mistas de Compras no exterior, de suprimentos e de material bélico caro, inadequado e ineficiente.
Em 1991, com o fim da Engesa, articulado pelo governo dos EUA com a colaboração do governo brasileiro, o Exército ficou sem um fornecedor nacional de um tanque de combate do mesmo nível do Abrams norte-americano, do Challenger inglês ou do AMX-40 francês e de outros carros de combate nacionais, como o Urutu e o Cascavel.
O ASSASSÍNIO DO OSÓRIO
Assim, o Brasil, que já esteve próximo de produzir um dos mais modernos tanques de guerra do mundo, infelizmente, hoje voltou a ser um país importador de blindados usados, mal repotencializados e de segunda linha, como o Obus autopropulsado 105-M-108, porque em 1989 os EUA impediram que a Engesa vendesse 702 tanques pesados — os EE-T1 Osório — para o Exército saudita.
O contrato de US$ 7,2 bilhões acabou ficando com o grupo americano General Dynamics, fabricante do tanque M-1A1 Abrams, segundo colocado nas provas de desempenho promovidas pela Arábia Saudita.
A Engesa participou com o Osório, disputando os testes no deserto sob temperaturas que chegavam a 50 graus celsius, contra o Challenger, o AMX-40 e o M-1A1 Abrams.
O EE-T1 Osório pesava 41 toneladas vazio, peso limite para o seu transporte em carretas rodoviárias, usava blindagem de placas duplas, e levava como arma principal um canhão de 120 milímetros capaz de disparar munição supersônica. Além disso, incorpora vasta carga eletrônica.
O tanque brasileiro era o único dos concorrentes projetado especificamente para atender às exigências da licitação. Ao final de uma semana de ensaios, o Osório havia vencido todas as provas.
Em entrevista para o jornal O Estado de São Paulo de 10/11/2002, um engenheiro de armamentos, ex-executivo da Engesa disse: "Nesse momento as luzes de emergência se acenderam no governo americano. A primeira consequência foi a surpreendente declaração de que a concorrência chegava ao fim com dois produtos possíveis de serem comprados, de acordo com o anúncio feito em Riad pelo ministro da Defesa, príncipe Sultan Azsiz Abdulazis. Essa foi a forma encontrada para ceder às pressões de Washington e manter o M1-A1 no páreo.
Na época, começou a circular no Senado e na Câmara um documento conclamando senadores e deputados a se envolverem no processo para impedir o fechamento da Engesa, as demissões de trabalhadores e a perda de mercados cativos caso a encomenda do Osório não fosse concretizada com a Arábia Saudita, país nem sempre amigo." Concluiu.
O encontro marcado para a assinatura do protocolo de compra do Osório entre o governo brasileiro e o da Arábia Saudita foi marcado duas vezes pelo então presidente Fernando Collor de Mello diretamente com o rei Fahd.
O primeiro, em agosto de 1990, não foi possível porque o príncipe Sultan quebrou a perna. Por isso, em outubro de 1990, Collor anunciou uma nova data e os nomes que comporiam a comitiva oficial liderada pelo general Leônidas Gonçalves, ex-ministro do Exército. A cerimônia seria realizada em Roma.
Em seguida foi anunciado um novo cancelamento, por causa da mobilização para a guerra contra o Iraque. Finalmente, em novembro daquele ano, a Arábia fez o anúncio de que fecharia o contrato com a General Dynamics americana.
Soube-se depois que a formalização para a compra dos tanques americanos já havia sido concluída mesmo antes dos contatos de Collor com o rei saudita.
Como a Engesa havia apostado todas as suas fichas no desenvolvimento do Osório, cuja venda para a Arábia era tida como certa, contraiu uma dívida de US$ 53 milhões — motivo para a sua falência — que tranquilamente poderia ter sido refinanciada com o apoio do governo federal.
Resumindo, os sauditas "puxaram o tapete" e Fernando Collor deu a "cama de gato" não encomendando nenhuma unidade do Osório para o Exército Brasileiro. Assim, a Engesa desapareceu fechando cinco fábricas e extinguindo cerca de 6 mil empregos com graves consequências econômicas, sociais e militares.
Depois deste lamentável episódio, o Brasil comprou para o Exército 87 tanques Leopard lAl da Bélgica e 91 M-60 A3 TTS dos EUA.
Recentemente, os dois últimos exemplares do EE-T1, que faziam parte da massa falida da Engesa, depois de uma árdua campanha cívica, foram incorporados ao Exército Nacional com autorização judicial. Talvez algum governante já tenha assinado secretamente a nossa rendição, em termos mais vis do que os do "Tratado de Versalhes", e o Brasil e suas FFAA ainda não foram avisados.
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