Em 27 de julho, reportagem do Congresso em Foco mostrou que,
apesar de fartamente documentada, a CPI do Cachoeira não avança nas
investigações sobre a rede criminosa comandada pelo contraventor Carlos
Cachoeira, preso desde 29 de fevereiro. Com alguns dos próprios membros do
colegiado sob suspeita de envolvimento com o grupo de Cachoeira, responsável
indireto pela cassação do ex-senador goiano Demóstenes Torres (ex-DEM), em 11
de julho, a CPI em funcionamento desde 2 de maio tem sido palco de “depoimentos”
com investigados em silêncio, esclarecimentos já de conhecimento das
autoridades públicas e discussões entre parlamentares que, não raro,
transformam-se em constrangedores bate-bocas. No mais recente ato da comissão,
postergação dos trabalhos: a CPI só retoma as atividades a partir da segunda
quinzena de outubro, na melhor das hipóteses.
Documentada, CPI do Cachoeira produz pouco
Há quem veja nessa disfunção um “acordão” que, costurado por
parlamentares e partidos nada interessados nas investigações, redundaria em
“pizza”, como o jargão popular se acostumou a chamar a ausência de punição a
quem, de fato, cometeu desmandos. Um dos mais antigos parlamentares em
atividade, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) cansou de esperar os avanços da
comissão de inquérito: ele protocolou requerimentos no Conselho de Ética e na
Corregedoria do Senado para a abertura de procedimento investigatório e sindicância
sobre a conduta dos membros da CPI do Cachoeira.
Um quarto da CPI tem problemas na Justiça
Para Simon, há indícios de que alguns deles “estão atuando
em desacordo com os postulados elementares do decoro parlamentar”. “Salvo
melhor juízo, conforme será detalhado na justificação deste requerimento,
parece-nos que o comportamento da maioria dos senhores senadores tem sido o de
evitar que o inquérito parlamentar em curso avance além do que a Polícia
Federal já desvendou nas chamadas operações ‘Vegas’ e ‘Monte Carlo’, o que
configuraria, por parte de suas excelências, irregularidades incompatíveis com
o decoro parlamentar [negrito de Simon], à luz do art. 55, inciso II, da
Constituição Federal e a Resolução nº 20, de 1993, que ‘Institui o Código de Ética
e Decoro Parlamentar”, diz a apresentação dos requerimentos.
Cassação da palavra
Em um breve histórico sobre o funcionamento da CPI e o
esquema criminoso operado por Cachoeira, Simon afirma na justificação dos
requerimentos que há “óbvia orientação política”, por parte de alguns dos
membros da CPI, com objetivo de “frear determinadas linhas de investigação”.
“Salta aos olhos, além disso, que a CPMI tenha aprovado um
procedimento de inquirição em que a palavra dos parlamentares foi CASSADA
[sic]. Se as CPMIs [comissões parlamentares mistas de inquérito] hoje sofrem
com a falta de colaboração de depoentes que procuram não se auto-incriminar,
esta CPMI inventou algo lesivo ao princípio básico de qualquer Parlamento, o
uso da palavra. Como pode haver um órgão parlamentar em que é proibida
manifestação por parte de seus integrantes?”, questiona o senador, referindo-se
ao não questionamento a depoentes que, na condição de investigados, chegam à
comissão protegidos por habeas corpus para se manter em silêncio.
Esvaziada, CPI do Cachoeira não consegue ouvir depoentes
Simon diz estranhar ainda o fato de o comando da CPI ter
alegado compromissos de seus membros em campanhas eleitorais para suspender os
trabalhos até outubro. “Agora, nesta semana, entretanto, quando o Senado
Federal está trabalhando em esforço concentrado, por que a CPMI resolveu não
funcionar? Seria um óbvio contrassenso lógico!!! Mas a explicação é política,
ética e moral: as lideranças, reunidas no dia 25 de agosto, adotaram uma
decisão que significa sabotar os trabalhos [grifo do senador]”, acusa o
peemedebista, que não foi indicado pelo partido para integrar a comissão.
Em toda a peça de requerimento, Simon usa a palavra
“senadores” para se referir aos integrantes da CPI, que é mista, ou seja,
composta também por deputados. A restrição é regimental, uma vez que os órgãos
do Senado acionados só podem investigar e executar sindicância sobre os membros
da própria Casa.
Passos de tartaruga
Até agora, o maior resultado da CPI do Cachoeira foi contribuir
para a cassação de Demóstenes Torres. A comissão recolheu uma soma importante
de documentos, como milhares de grampos telefônicos e dados bancários inéditos
da empreiteira Delta – para a qual Cachoeira fazia lobby, segundo a Polícia
Federal. Além disso, em 24 de agosto, o colegiado foi abastecido com um
conjunto de mídias apreendidas em poder da quadrilha. Mas o material é
composto, entre outras coisas, por vídeos eróticos e shows de música sertaneja.
Simon argumenta que, apesar de estar recheada de documentos
em seu arquivo, a CPI não produziu fatos novos relevantes além do que a PF fez
nas operações Vegas e Monte Carlo. Os rastros do dinheiro das contas da Delta,
por exemplo, são pistas em potencial. Mas até agora pouco exploradas pela
comissão. O material sai a conta-gotas em reportagens diversas, como a que
revelou que R$ 133,8 milhões foram pagos a dez empresas de fachada – e nove
criadas em anos eleitorais, 2008 e 2010.
Diante dos fatos, há uma crescente preocupação com o tempo.
A possibilidade de prorrogação do período de funcionamento da CPI em até seis
meses ainda não foi discutida, mas deve entrar na pauta da próxima reunião
administrativa, em outubro. O encerramento dos trabalhos está previsto para 4
de novembro. Mas, com a suspensão dos trabalhos e os rumos das investigações,
como denuncia Simon, restaria pouco tempo para concluir as investigações.
Fonte: Congresso em Foco 13/09/2012