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sexta-feira, 16 de maio de 2014

"VENENO FISCAL" OU "OPERAÇÃO SUICIDA" jn

Enviado por Míriam Leitão e Alvaro Gribel - 
15.05.2014
 | 
15h00m
COLUNA NO GLOBO

Veneno fiscal

Os números são espantosos. De dezembro de 2006 até março deste ano, o total dos empréstimos do Tesouro ao BNDES saltou de R$ 9,9 bilhões — 0,4% do PIB — para R$ 414 bilhões — 8,4% do PIB. Esta semana o governo pediu ao Congresso a liberação de mais R$ 30 bilhões. É criação de dinheiro e contabilidade criativa ao mesmo tempo. Mas para o presidente do BNDES, as críticas estão envenenadas.
O veneno não está na crítica, mas nesse instrumento tóxico de endividamento público. O governo alega que está emprestando ao BNDES, mas, evidentemente, a instituição financeira jamais pagará isso ao Tesouro. Definir como "empréstimo" é manobra de polichinelo para enganar a contabilidade da dívida líquida. O veneno está também na forma de se transferir dinheiro do contribuinte para os grandes empresários. O Tesouro se endivida a 11% e empresta a 5%. Isso é realmente um veneno.
Dias atrás o governo pegou mais um dinheiro no BNDES, o segundo resgate fez com que o banco zerasse as reservas estatutárias, recurso que foi permitido pelo decreto 8.034, de 2013. Então é assim: o governo se endivida, faz um suposto empréstimo ao BNDES, depois o Tesouro pega dinheiro com o banco para turbinar seus resultados. É criação de dinheiro. Veneno puro.
No começo do ano, quando o governo anunciou um contingenciamento, algumas pessoas acreditaram que a Fazenda estava falando sério. Depois disso, foram retomados os truques para fabricação de dinheiro e manipulação de números. É o que diz o economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria.
— Quando houve o anúncio de contingenciamento, demos um voto de confiança. O governo parecia ir pelo caminho de mais austeridade e controle de gastos porque havia o risco de rebaixamento da nota de crédito. Erramos nessa análise, porque o compromisso não durou três meses — disse.
Ele acha que de lá para cá o governo fez várias anúncios de aumentos de gastos ou de renúncia fiscal, como o da tabela de imposto de renda, reajuste do Bolsa Família, postergação do aumento de imposto sobre bebidas. Podem ser boas medidas, mas elas ajudam a erodir ainda mais o resultado do superávit primário. Por outro lado, aumenta seu endividamento para mandar dinheiro ao BNDES.
— Do primário do primeiro trimestre, de R$ 13,1 bilhões, 45% são dividendos pagos por BNDES, Caixa e Banco do Brasil. Além disso, houve aumento de gastos reais em 8,4%, enquanto as receitas cresceram 4,2%. A contabilidade criativa está a todo vapor — afirmou Felipe Salto.
Veneno é isso. É ir construindo falsas fontes de receita, endividando-se para emprestar a uma taxa de juros muito menor do que paga em sua dívida, usando as reservas estatutárias do banco para pagar dividendos e, tudo isso, permitindo que o banco viva sob o manto protetor do sigilo bancário para não prestar contas das suas decisões. Isso envenena a economia brasileira, principalmente porque chegou a uma enorme dimensão e não há garantias de que isso vai acabar um dia.