Dilma fraquejou
O Estado de S.Paulo – Opinião - 111202
Faltou combinar com os "gagás", como o deputado pedetista e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, se referiu, com a costumeira falta de compostura, aos membros da Comissão de Ética Pública da Presidência. Ao decidir manter o chefão do PDT, Carlos Lupi, no Ministério do Trabalho até a reforma do Gabinete prevista para o começo do ano, a presidente Dilma Rousseff aparentemente não levou na devida conta os riscos embutidos no exame dos malfeitos do ministro pelo colegiado que avalia a conduta dos integrantes da alta administração federal. Também não considerou que, mantendo a seu lado um tipo como Lupi, exonerou, na prática, os probos membros do Conselho de Ética Pública e afrontou a imensa maioria do povo brasileiro, cuja vida se pauta pela honestidade e pelo trabalho árduo.
Ela já tinha errado ao imaginar que poderia deixar Lupi agonizando na Esplanada apesar da multiplicação de revelações da imprensa sobre o histórico do figurão, como se a expectativa da sua demissão em prazo relativamente curto neutralizasse o noticiário que a desmoraliza por conservar na sua equipe um tipo cuja estatura moral de há muito deixou de ser motivo de controvérsia. Pior ainda para a "gerentona", com fama de controladora desde os seus tempos de ministra, foi ser surpreendida literalmente dentro de casa - a Comissão de Ética faz parte da estrutura da Presidência da República - pela mais severa condenação infligida a um membro do primeiro escalão governamental.
Podendo considerá-lo inocente, adverti-lo, censurá-lo ou, enfim, recomendar a sua exoneração, pela primeira vez desde a sua criação, em 1999, o órgão aprovou por unanimidade esta última alternativa, que conduziu a presidente a uma enrascada. Pois, se ela desdenhasse da recomendação, estaria afrontando aos olhos da sociedade o parecer de um colegiado que tem a palavra "ética" no nome. Caso seguisse o conselho, não haveria quem não se perguntasse por que ela precisou esperar por isso, quando podia fazer jus à imagem edificante de faxineira-mor do Executivo, mostrando sem demora a porta de saída para mais um ministro maracuteiro - o quinto, sem contar Antonio Palocci, que fez estranha fortuna antes de ser nomeado. Na segunda hipótese, de toda maneira, ela conservaria a dignidade política.
Mas ela preferiu não comprar mais uma briga com a sua base parlamentar, dessa vez com o PDT, nem tampouco confirmar a escrita do enfeudamento partidário do Gabinete, substituindo Lupi por outro do partido que ele controla - e do qual só não conserva formalmente o título de presidente porque dele teve de abrir mão, quando a mesma Comissão de Ética entendeu ser o cargo incompatível com a condição de ministro a que o presidente Lula o guindou em 2007. Daí, por sinal, a fúria do deputado que adotou o codinome Paulinho da Força com os "retardados que vivem perseguindo" Lupi.
A grosseria, evidentemente, não altera a verdade trazida à tona. Tão extensa e variada é a folha corrida do prepotente personagem notabilizado por dizer que, para tirá-lo, só "abatido à bala", que a comissão não tinha escolha, sob pena de cair no descrédito. O organismo presidido pelo jurista Sepúlveda Pertence concluiu o óbvio: as alegações que Lupi apresentou em sua defesa à própria comissão, ao Congresso e à imprensa para negar o envolvimento com achaques de ONGs no Trabalho foram "insatisfatórias" e "inconvincentes". Isso sem falar na mentira sobre a viagem em voo fretado na companhia do dono de uma entidade beneficiada com R$ 13,9 milhões em convênios com a pasta, a exigência de paga para o registro de sindicatos - e o fato de Lupi ter sido funcionário fantasma da Câmara dos Deputados entre dezembro de 2000 e junho de 2006, período na maior parte do qual "assessorava" um vereador do Rio de Janeiro, recebendo indevidos salários, portanto, de duas fontes públicas. Mesmo para os padrões do indigitado, é dose.
Ontem cedo, Dilma o recebeu para uma conversa. Mas a presidente durona fraquejou. Sem medo do ridículo, fez saber que resolveu aguardar novas explicações de Lupi. Completando a farsa, mandou pedir à Comissão de Ética que diga por que, afinal, sugeriu a demissão do ministro. Por que será, não?