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quarta-feira, 30 de julho de 2008

LIGAÇÕES PERIGOSAS

O pacto político entre o tráfico e parte do MST na Rocinha

Há mais de dez anos promovendo uma espécie de "intercâmbio cultural" entre setores dos movimentos rural e popular na Rocinha, a maior favela da América Latina, um dos líderes do MST, José Rainha Júnior, caiu nas graças do chefe do tráfico local, Antônio Bonfim Lopes, o Nem, que se encantou com o líder dos sem-terra e promoveu uma espécie de pacto político com direito à cartilha eleitoral - a ata da reunião na qual o tráfico impõe um candidato único a vereador na Rocinha, como está na manchete do GLOBO de hoje. Como o presidente licenciado da associação de moradores, Claudinho da Academia, se apresentou como único candidato da favela, escolhido, segundo ele, por cem líderes locais, tornou-se agora o principal suspeito de desfrutar do curral eleitoral mantido pelo tráfico na Rocinha.
Parabéns ao delegado Allan Turnowski, diretor das delegacias especializadas da Polícia Civil, que coordenou a operação e não abafou a "bomba" que tinha em mãos. Caiu a "casa" onde funcionava o comitê eleitoral do tráfico. Saiba mais no Globo Online.
Cabe agora à Polícia Federal e o Ministério Público federal tomarem providências urgentes para que o TRE possa cassar a candidatura de Claudinho antes mesmo que ele desista do pleito. Para que ele não seja acusado injustamente, é preciso também uma profunda investigação das supostas ligações dele com os criminosos. Se o tráfico e os quadros do MST em algum momento pensaram em ajudar a comunidade - no que sinceramente não acredito - vão acabar por prejudicá-la, já que agora ela corre o risco de não ter candidato algum que represente seus interesses. Como diziam antigamente, o tiro saiu pela culatra.
E mais: o episódio começa a trazer à tona ligações perigosas entre o crime organizado e setores do MST, representados por Rainha. A cúpula do movimento alega que Rainha não pertence mais à liderança, embora ele esteja à frente de uma marcha de sem-terra no Pontal do Paranapanema (SP). Se o Ministério da Defesa não passar a monitorar essas ligações perigosas, com certeza agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) já estão de olho na movimentação na Rocinha: há informações de que o "intercâmbio cultural" promovido por Rainha levou quadros da "liderança" da favela para conhecer o trabalho de campo que é feito no Pontal de Paranapanema. Portanto, há fortes indícios de que ocorre na Rocinha mais uma tentativa de revolucionários marxistas se associarem aos criminosos para criar uma espécie de foco revolucionário, que una os excluídos do campo e das cidades, com um empurrãozinho bélico do tráfico, que já manifesta seus pendores para a política. A história já comprovou que isso não dá certo: foi justamente da união entre presos políticos e comuns (os assaltantes condenados pela Lei de Segurança Nacional), na Ilha Grande, que nasceu uma das facções do baixo crime organizado no Rio. O primeiro nome desse grupo era Falange Vermelha. (assista ao filme "Quase Dois Irmãos", de Lúcia Murat).
A Rocinha, inclusive, tem uma trajetória que favorece esse tipo de utopia da revolução socialista. Considerada um dos entrepostos da droga na Zona Sul, a Rocinha, uma espécie de País de São Saruê a beira-mar plantado, é uma favela de vanguarda, na política e no comportamento. Quando morei lá por uma semana, há 20 anos, entrevistei o então chefe do tráfico, Sérgio Bolado, que era bem articulado e tinha um nível de consciência política inimaginável para um traficante de área pobre. Ele me contou que a Rocinha foi uma das primeiras favelas do Rio a promover um comando único dos criminosos então liderados por Dênis da Rocinha, também já morto, que estabeleceu uma espécie de aliança com moradores, a quem supria com eficiência a ausência do Estado, na forma de assistência social. e comunitária. Os sucessores de Bolado, um triunvirato formado por Naldo, Buzunga e Brasileirinho, também apregoavam que a revolução social seria implantada pelas favelas com apoio armado do tráfico.
As notícias que chegam da Rocinha, de que "está acontecendo algo diferente" lá - segundo uma própria militante do MST contou ao repórter Flávio Tabak, do GLOBO - revelam que de fato há em curso uma combinação perigosa para a sociedade, que reúne crime organizado, políticos e líderes da revolução de plantão. Ou seja um barril de pólvora com pavio e tudo, à espera apenas de uma centelha.