| A UTOPIA E A CASCAVEL |
| Percival Puggina |
O sujeito na telinha da tevê torcia o nariz com repugnância. Ele se referia às pessoas que têm grade de proteção na frente da casa, ou moram em condomínios fechados, ou dispõem de vigilância, câmeras e alarmes, como se fossem marias-antonietas contemplando a plebe do alto de seus luxos, soberba e alienação. Era um de muitos, um de tantos, no mundo acadêmico e nos meios de comunicação, que fazem análise marxista até de chinelo velho. Em toda oportunidade se referem aos artefatos e serviços de proteção que usamos como se equivalessem às defesas de que os grandes traficantes se cercam em seus bunkers. Dizem-nos assim: "Vocês se isolam do mundo, cultivam preconceitos, matriculam os filhos em escolas particulares também protegidas por grades e agentes de segurança". Descrevem uma realidade que domina a paisagem urbana das cidades brasileiras, como sendo coisa de gente preconceituosa, paranóica e indiferente à miséria alheia. No entanto, bem sabemos todos quanto esses cuidados são indispensáveis num país onde o crime espreita em cada esquina, em cada porta de garagem, em cada restaurante ou agência bancária. A espiral ascendente da bandidagem não pára de se ampliar desde que a análise marxista substituiu o rigor da lei pela tolerância ideológica às suas práticas. Sujeitos como o de nariz torcido na telinha da tevê querem provar, com ares solenes e doutas perspectivas, que somos os réus dos crimes que contra nós praticam; que somos uma espécie de celerados sociais, atemorizados com as consequências dos males que advêm de nossa resistência às suas fracassadas utopias, às suas estrelas e bandeiras vermelhas. O resumo de sua mensagem à sociedade, em matéria de segurança, é a de que, notadamente nos crimes contra o patrimônio, o criminoso é um anjo vingador que vem ao mundo para agir contra os insensíveis apegados aos frutos da sua cupidez. E o resumo de sua mensagem em matéria sociológica é a de que existem pobres porque existem ricos. Rematadas tolices! Se a criminalidade aumenta no Brasil num período em que o governo afirma que o desemprego cai e a renda evolui positivamente, parece óbvio que não há uma relação direta de causa e efeito entre pobreza e criminalidade. Pelo outro lado, todo o posto de trabalho vem da riqueza gerada pelo setor privado. Todo! Inclusive o emprego público, remunerado pelos tributos incidentes onde haja produção. O Estado é um gastador da riqueza de quem produz. É rematada tolice afirmar que a livre empresa ou que as economias abertas, concentrem renda e que a pobreza tenha isso como causa. Bobagem! O que mais esperam os desempregados nos países em crise é que suas economias nacionais comecem a vender, as empresas privadas a produzir e a reempregar, e a sociedade volte a consumir. Há alegria nos mercados quando os indicadores apontam sinais positivos no mundo dos negócios.O que os adoradores do Estado, que gostam de dançar ciranda em torno dos cofres públicos, não contam para você, leitor, é que a verdadeira concentração de renda, nociva e ativa, empobrecedora, que paralisa a atividade econômica como picada de cascavel derruba a vítima, é o Estado que se apropria de 40% do PIB nacional. Aí está a causa da pobreza do pobre: um Estado que concentra renda nas próprias mãos, que se deixa roubar, que gasta de modo irresponsável, que sustenta uma corte de madames pompadour, gastos secretos, luxos inauditos e extravagantes comitivas. Como não poderia deixar de ser, esse Estado entrega aos pobres do país, em péssimas condições, a Educação, a Saúde e o Saneamento que, se bons fossem, lhes permitiriam sair da miséria e cuidar bem de si mesmos. _____________ * Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, membro do grupo Pensar+ |
