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sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Brasil e Estados Unidos


ANO 115 Nº 99 - PORTO ALEGRE, QUINTA-FEIRA, 7 DE JANEIRO DE 2010

Jornal > Juremir Machado da Silva

Art. credito João luiz Xavier

É uma velha questão: o que nos faz diferentes dos Estados Unidos? A minha resposta é simples: o senso do espetáculo. Os americanos só gostam de esportes que possam terminar 101 a 99. Encerrar um jogo de 90 minutos com empate em zero a zero revolta qualquer um nos Estados Unidos. É como ir ao cinema sem pipoca e Coca-Cola. Uma perda de peso. Na política não é diferente. Como se escolhe um candidato a presidente nos Estados Unidos? Por meio das prévias. Boa parte do jogo consiste em disputar a condição de candidato em etapas que lembram a mega-sena da virada. Quem vai ficar com a bolada de votos da superterça? É adrenalina pura. Façam as suas apostas!


Enquanto jogam, os americanos ficam sabendo tudo sobre os candidatos a candidato, especialmente as fofocas. A vida pessoal conta muito. Nosso estilo é diferente. Muito mais evoluído, discreto e sóbrio. Como se escolhe um candidato por aqui? Ninguém sabe. A ministra Dilma, que jamais foi candidata a coisa alguma, nem a dirigir o seu edifício, foi designada por Luiz Inácio para sucedê-lo. Quais foram os processos de discussão? Em que instâncias do partido se debateu essa candidatura de "consenso"? Alguém teve a oportunidade de apresentar uma candidatura alternativa? Quais são os trunfos de Dilma para ser a predileta do cacique? Mistério. Não há Mega-Sena da virada nem superterça eleitoral. A prévia perdeu o acento (e o assento) e ficou como Luiz Inácio previa: coisa do passado regional. Parece, a bem da verdade, que se falou do assunto num churrasco com salsichão, maionese e muita cerveja. Mas foi antes de um jogo do Corinthians e ficou assim mesmo.
No PSDB, que é o PT da turma dos camarotes, a dinâmica é radicalmente diferente. Em vez de uma pessoa decidir sozinha, faz-se um jantar com três caciques num restaurante fashion, bebe-se um bom vinho francês, come-se lagosta, fala-se "hélas" e "of course", cita-se Max Weber e Anthony Giddes e a prévia está concluída. Em todo caso, antes do jantar, FHC toma a decisão sozinho que é para não ter erro nem momentos desagradáveis durante o encontro. Imediatamente algum Aécio Neves da vida decide abandonar a corrida. Convenhamos que é um processo muito mais elegante. Somos tão originais que o maior partido do país, o PMDB, tampouco se dá o trabalho de fazer prévia. Simplesmente não apresenta candidato. O PMDB descobriu que a melhor maneira de nunca sair do poder é não concorrer ao cargo mais ambicionado do poder. Democratas e Republicanos, nos Estados Unidos, não sabem disso.

Se fosse no Brasil, eles já teriam feito uma aliança em nome do que se pode esconder em meias e cuecas. O que separa os Democratas dos Republicanos? O orçamento para a guerra. O que separa o PT e o PSDB? A guerra pelo orçamento. Os atrasados americanos ainda acham que política é um espetáculo público. Nós, mais adiantados, já estamos na era das sessões privadas. Prévia é coisa de país anacrônico, onde o poder passa de pai para filho e do marido para a mulher. Entre nós, o poder é uma ação entre amigos, podendo, se necessário, incluir os inimigos.

JUREMIR MACHADO DA SILVA > correio@correiodopovo.com.br