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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

PAC PLANO DE ACELERAÇÃO DA CORRUPÇÃO

PAC prevê "desfavelizar" área sem favela
Prefeitura de Maringá (PR) recebe R$ 20 milhões do governo Lula para revitalizar local; casas divulgadas em site não são da área
JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MARINGÁ (PR)
O Ministério das Cidades liberou recursos de R$ 20 milhões para Maringá (a 428 km de Curitiba) desfavelizar um bairro já urbanizado. A obra, que pode chegar a R$ 25,2 milhões com contribuições do governo do Paraná e do município, é anunciada no site do governo federal como parte do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para urbanização de favelas no Estado.
Na apresentação do projeto, no site do governo federal, fotos de quatro casebres são exibidos como se fossem localizados no bairro Santa Felicidade.
A Folha apurou que três deles não existem em Maringá. O outro, visitado pela reportagem, é a casa de uma catadora de papel em um fundo de vale no Jardim Alvorada 3, na zona norte da cidade. Só que o Santa Felicidade fica na zona sul.
Além de as fotos exibidas não serem do Santa Felicidade, os moradores do bairro (267 proprietários no total) dizem que a prefeitura quer usar a verba do PAC para expulsá-los do local. O prefeito Silvio Barros 2º (PP) nega (leia texto ao lado).
O prefeito é irmão do ex-líder do PP na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP), e do mesmo partido do ministro Márcio Fortes (Cidades). No site oficial do deputado, o Santa Felicidade aparece como obra do patriarca da família, Silvio Barros, que, prefeito de Maringá em 1976, iniciou o processo de desfavelização da cidade, que hoje diz não ter favelas.
Foi na gestão de Silvio Barros que, por meio do programa Profilurb, com recursos do Banco Nacional de Habitação, as primeiras 30 casas foram construídas no bairro.
Em 1983, sob Saíd Ferreira, o local foi transformado no que é atualmente, com a construção de mais 237 casas no sistema mutirão, em que as casas eram entregues sem as repartições internas.
"A gente viveu no bairro em seus piores momentos, sem asfalto e esgoto. Agora que já temos tudo isso, inclusive creche e escola, eles querem que a gente saia porque a região é valorizada", disse Maria Conceição Silva, 62, uma das moradoras transferidos da favela Chácara 15, em 1983, para o local.
Na época, muitas das mulheres trabalharam como serventes no mutirão. "Tivemos dois anos de carência, mas pagamos pelo terreno. Hoje nos querem fora. E falam que é desfavelização. Onde já se viu favela como o nosso bairro? Minha casa tem oito cômodos", disse Tereza Luísa da Silva, 59, que ampliou a casa nos últimos anos.
A professora da Universidade Estadual de Maringá Ana Lúcia Rodrigues, 45, coordenadora do Observatório das Metrópoles (rede nacional de pesquisadores sobre a ocupação das regiões metropolitanas), disse que o projeto da prefeitura é contrário ao Estatuto das Cidades, já que a reurbanização não beneficia a população.
"É um claro processo de segregação da população de baixa renda, ao se propor que uma parcela ou a totalidade dos moradores -não se sabe, porque o projeto é mantido em segredo- deixem seus lares em nome de uma revitalização."
Quando as casas foram construídas no Santa Felicidade, em 1983, existia na zona sul um curtume que depreciava o setor imobiliário na região. Hoje, com a instalação de um condomínio residencial de luxo, a área é uma das mais valorizadas da cidade. Donos de imobiliárias consultados estimaram em R$ 260 o m2 na região.
"O prefeito usa a verba do PAC para retirar o enclave pobre de uma região que querem que seja de luxo", disse a advogada Jaqueline Batista Pereira, que defende os moradores.