24/06/2012
às 8:08O que, afinal, quer Dilma? Reeditar a “Guerra do Paraguai”? O Brasil tem de ser mais respeitoso com a soberania de um país vizinho!
Sabem o que há, de verdade!, na raiz da reação negativa dos países sul-americanos à deposição de Fernando Lugo? Má consciência! Também e muito especialmente no Brasil. Já chego lá. Antes, algumas considerações.
O Paraguai está em paz dois dias depois de Lugo ter sido deposto pelo Congresso, segundo a mais estrita e rigorosa letra da Constituição. Mas não ficará assim por muito tempo se depender do Brasil e de outros países sul-americanos. Parece que a presidente Dilma Rousseff, seguindo os passos aloprados de seu antecessor no caso da crise hondurenha, não se conforma com a praça vazia. A expectativa era a de que milhões fossem às ruas em defesa do presidente deposto. Não apareceu um só. O mesmo, aliás, havia ocorrido em Honduras. As manifestações só começaram quando Manuel Zelaya resolveu organizar a “resistência” na embaixada do Brasil, com o apoio de Lula e Chávez.
A Constituição foi rigorosamente seguida. Mas Dilma não gostou.
A Câmara aceitou a denúncia por 73 votos a 1. Mas Dilma não gostou.
O Senado aprovou o impedimento por 39 votos a 4. Mas Dilma não gostou.
O Judiciário declarou legal a deposição de Lugo. Mas Dilma não gostou.
Até a Igreja Católica no Paraguai reconhece como legítimo o impeachment. Mas Dilma não gostou.
O povo paraguaio, vê-se, aceitou a solução. Mas Dilma não gostou.
A Câmara aceitou a denúncia por 73 votos a 1. Mas Dilma não gostou.
O Senado aprovou o impedimento por 39 votos a 4. Mas Dilma não gostou.
O Judiciário declarou legal a deposição de Lugo. Mas Dilma não gostou.
Até a Igreja Católica no Paraguai reconhece como legítimo o impeachment. Mas Dilma não gostou.
O povo paraguaio, vê-se, aceitou a solução. Mas Dilma não gostou.
Então vamos ver. A lei foi cumprida. A democracia continua em pleno funcionamento. Os Poderes instituídos e o povo do Paraguai reconhecem o novo presidente. Qual é, afinal de contas, o problema do Brasil? “Ah, o rito foi sumário!” Foi porque as leis paraguaias permitem que assim seja. O Palácio do Planalto pode tentar exportar alguns dos nossos legisladores para ao país vizinho para que se façam, então, leis melhores, mais ao gosto do nosso governo, não é mesmo?
Não! Definitivamente, não é assim que a música toca! Ameaçar o Paraguai com o isolamento quando estão em vigência todas as instituições que caracterizam a democracia é inaceitável. Qual é a acusação? Sim, trata-se de má consciência e explico por quê.
Alguns governantes latino-americanos, tendo as injustiças sociais como desculpa, passaram a acreditar que podem desrespeitar abertamente as leis que os elegeram para, então, fazer… justiça! A desigualdade social no Paraguai é, de fato, obscena. Há dois caminhos para dar uma resposta: com leis e debate democráticos — e isso requer competência, capacidade de negociação, implementação paulatina de medidas… E há o outro modo: partir para a pistolagem. Lugo prometeu uma ampla reforma agrária no país (nem vou entrar no mérito se o caminho era mesmo esse). Seus planos não saíram do papel. Não obstante, passou a tolerar o banditismo de grupos extremistas que falam em nome dos sem-terra. Deu no que deu.
Ou por outra: incompetente que era, Lugo não conseguiu apresentar um plano ao país; demagogo que era, passou a manipular o extremismo a seu favor. Os bandoleiros ameaçam justamente a parte mais virtuosa da produção agrária paraguaia — que inclui os brasileiros, é bom lembrar! Aliás, cuidasse o nosso governo um pouco mais do seu próprio povo, teria vários motivos para estar agastado com Lugo. Há uma perseguição organizada aos chamados “brasiguaios” no país. As supostas “vítimas das desigualdades” estão invadindo, saqueando e depredando fazendas. Há famílias que foram expulsas de suas terras. Não se ouviu até agora de um pio do Itamaraty ou Dilma Rousseff.
Os governantes sul-americanos que ameaçam isolar o Paraguai — e, lamento!, isto vale também para Dilma — estão, na prática, cuidando mais de si mesmos do que de Fernando Lugo, que não tem condições, é evidente, nem legais nem políticas de voltar ao poder. Estão dizendo que NÃO ACEITAM SER DEPOSTOS POR LEIS DEMOCRÁTICAS NEM QUANDO AS TRANSGRIDEM. Ainda que com palavras um tanto oblíquas, de sentido enviesado, afirmam que se deve tolerar que o chefe do Executivo mande as leis às favas e se junte a grupos que desrespeitam os fundamentos da democracia, mas que é intolerável que o Congresso e a Justiça usem as suas prerrogativas.
Ora, vejam nesta página uma crítica que fiz a um texto de Janio de Freitas publicado hoje na Folha. O valente defende os mensaleiros, diz que o julgamento no Supremo traduz o confronto entre os “reformistas” e os “conservadores”, que o resultado é crucial para a democracia brasileira, que se trata de uma questão política e que, conclui-se, o Supremo só dará provas de isenção se absolver os acusados. Vejam lá o que escrevi a respeito.
É precisamente essa má consciência que está na raiz da acusação falsa, escandalosamente mentirosa, de que houve “golpe” no Paraguai. Tivessem morrido 17 pessoas num confronto por terra num Paraguai governado pela “direita”, haveria uma penca de ONGs gritando mundo afora: “Massacre! Massacre!”. Se o Congresso decidisse impichar o presidente por “mau desempenho”, seria aplaudido como expressão da verdadeira democracia. Como tudo se deu na gestão do “progressista” Lugo, então ouvimos aquele ruidoso silêncio. Afinal, diria Janio de Freitas, ele é “um reformista”…
Acho que não convém Dilma fazer uma nova “Guerra do Paraguai” em defesa de um demagogo, que foi deposto segundo o que estabelece a lei. Não faltará um leito para abrigar o “bispo pegador”…