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sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Deploráveis distorções

 Mino Carta  21 de janeiro de 2011 às 8:56h

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Da imprensa nativa há quem faça diariamente, em meu exclusivo proveito, algo assim como um clipping oral: seleciona o que é indispensável averiguar. Janeiro é, porém, impiedoso comigo. Reparem: CartaCapital é produzida por 11 profissionais, incluídos dois sediados em Brasília, um no Rio e um em Paris. Neste momento, quatro estão de férias, a começar pelo redator-chefe que também desempenha o papel de clipeiro. Donde a súbita obrigação de ler os jornais antes de partir para a faina costumeira.
Na primeira página do Estadão de terça 18 leio a chamada de primeira página: “O fiasco do economista-cartola”. Não me permiti ler o texto
correspondente na seção de esportes. Conheço a história e me bastou o título. Luiz Gonzaga Belluzzo, protagonista do enredo, é meu eterno companheiro de mil aventuras, inclusive CartaCapital. Não é somente professor de economia, um mestre em matéria e mais algumas, mas também ousado sonhador. Imaginem que pretendeu demonstrar a possibilidade de se dirigir um clube de futebol sem ser cartola.
Belluzzo teve de abandonar seu propósito e renunciar à presidência do Palmeiras ao constatar que não há como exercer o cargo sem trair os princípios éticos que o nortearam vida adentro. Ser cartola é exatamente o que Belluzzo não quer. Creio que hoje em dia no mundo todo seja impossível gerir os obscuros negócios do futebol sem ser cartola, encabeçada a lista pelos senhores Joseph Blater e Ricardo Teixeira, diligentíssimos pupilos do cartola-mor, o inextinguível João Havelange.
O futebol tornou-se gramado ideal da corrupção, na porta dos estádios poderíamos escrever lavanderia, e isso é do conhecimento até do mundo mineral. Quando penso que o próximo Mundial acontecerá no Brasil padeço de um álgido sobressalto interior. Aliás, já começou a farra dos cartolas.
Em O Globo de quarta 19 leio declarações do presidente do STF, Cezar Peluso. Diz ele que a decisão final sobre o caso Battisti cabe ainda ao Supremo, chamado a examinar se o presidente Lula, ao negar a extradição, agiu dentro dos limites do tratado selado com a Itália em 1998, como de fato lhe cabia. A se considerar o relatório do próprio Peluso quando da sessão que optou pela extradição por cinco votos a quatro, e seus pronunciamentos depois da negativa presidencial, Lula baseou-se em um artigo do acordo já apontado como inaplicável pelo próprio STF.
Pergunto aos meus atônitos botões se o ministro Peluso não seria um visceral reacionário, a merecer ser crivado de ofensas, algumas francamente vulgares, como as recebidas com frequência crescente pelo acima assinado por enxergar na extradição a única saída lógica para o caso Battisti. Peluso teve também de explicar aos repórteres que as cortes internacionais, como a de Haia, não podem interferir nas decisões do STF. Ocorre que os perdigueiros da informação não conhecem os assuntos de que tratam e obrigam os entrevistados a perder tempo.
Leio ainda que os defensores de Battisti insistem no apoio amplo, geral e irrestrito à decisão de Lula. Soube também que em entrevista ao diário La Stampa de Turim, um dos três jornais italianos de maior tiragem e penetração nacional, o governador Tarso Genro, ex-ministro da Justiça, insiste em ignorar a verdade factual da situação da Itália nos anos de chumbo e a confundir terroristas autênticos com guerrilheiros da liberdade. Recomendo a leitura nesta edição da entrevista de Nando Della Chiesa, filho do general que derrotou o terrorismo naquele tempo turvo sem recorrer a uma única, escassa lei de exceção. Supõe ele que Genro e companhia nunca leram um livro de história, ou então há outros interesses em jogo.
Já houve tempo em que me atirei a achar que sem um forte abalo social, um sismo, uma revolução, não seria possível mudar o País entregue a uma elite predadora, incompetente e vendilhona. Não que, para contribuir ao terremoto, pretendesse apanhar na adega da casa da minha avó materna as espingardas dos tios-bisavôs, destinadas, a bem da sacrossanta verdade, a abater codornas. Não via, porém, outra solução, embora soubesse que esperava em vão. Hoje, depois de Lula e com Dilma (até o Estadão gosta dela, conforme o editorial de segunda 17), e graças também ao nosso crescimento em ritmo excelente, sou otimista e fico satisfeito com isso.
Aos meus botões, que se calaram, aturdidos, quando da pergunta feita muitas linhas acima, pergunto por que Eduardo Suplicy, Genro, José Dirceu, Greenhalgh, Marco Aurélio Garcia, e outros do mesmo porte, não partem logo, em companhia de Battisti, para a Revolução Proletária? Contariam com a pronta adesão de quem me insulta do anonimato da internet, e até às claras, pelo correio. Agora os botões respondem: uma obsoleta ideologia de antanho, adubada pela ignorância e pelo fanatismo, produziu no Brasil singulares e deploráveis distorções.

Mino Carta

Mino Carta é diretor de redação de CartaCapital. Fundou as revistas Quatro Rodas, Veja e CartaCapital. Foi diretor de Redação das revistas Senhor e IstoÉ. Criou a Edição de Esportes do jornal O Estado de S. Paulo, criou e dirigiu o Jornal da Tarde. redacao@cartacapital.com.br

13 Respostas para “Deploráveis distorções”

  • J Nascimento disse: O seu comentário está aguardando moderação. 
    rudi klingenberg disse:
    21 de janeiro de 2011 às 14:02
    Breve coletânea de frases pertinentes:
    “Ai dos vencidos”. (Breno, rei gaulês derrotado pelos romanos)
    “Um vencedor sempre tem razão” (Yoshy noh Toronaga, personagem de Shogun)
    “Os vencedores escrevem a História” (não lembro quem disse)
    Este assunto virou bandeira política. Será discutido ad nauseam e será decidido por quem tiver poder para isso.

    - Vou comentar o que diz o rudi….Pelo nome é estrangeiro, pelas frase de autores estrangeiros, também. Caro KLINGENBERG Isso aqui é Brasil, Aqui quem escreve a história é quem maneja a verba de propaganda do governo, e quem ratifica é a imprensa venal e faciosa.
    Mino está certo, O resto é resto.
  • Lenir Vicente disse:
    Meu caro Mino Carta, eu já lhe disse várias vêzes do meu respeito e apreço pelo o que Sr. representa para nossa imprensa livre e nossa Democracia, além de ser amigo do meu caríssimo Lula.Eu nunca o ofendi.Jamais me permitiria cometer tamanha idiotisse contra uma pessoa que tem toda minha admiração e não é de hoje.Se o sr. acha que eu o fiz em algum momento, com meus comentários, que às vezes cedem à paixão, peço-lhe humildemente desculpas.Não fico chateada quando o sr. chama de ignorante quem não aceita a extradição de Battiste.Eu já disse,apoio a decisão do Presidente porque acredito na seriedade dele.Como tb. acredito na do sr..O sr. diz se basear na história verdadeira, mas já li muitos argumentos contrários ao seu que me pareceram bastante verossímeis.Não acho certo o que a Itália faz, recorrendo à órgãos internacionais para fazer o Governo brasileiro reverter sua posição.Somos soberanos e nossas leis devem ser respeitadas.Na verdade acho uma tremenda falta de respeito.Não fizeram isso quando Battiste se encontrava sobre a proteção de Miterrant, por que, o fazem agora? Acho que o nosso Supremo ,que já lavou as mãos uma vez, vai , desta feita, favorecer o pedido do Berlusconi e, parece-me , de parte da sociedade italiana.Se isso acontecer, não tomarei como justiça feita, mas apenas uma imposição que nos remete à uma história não muito bonita do nosso passado.Não estou comparando Battiste com Olga Benário, de jeito nenhum, mas o sr. há de entender a minha desconfiança.Quando direita e esquerda se dão as mãos, principalmente lá na Europa, tem nos ensinado a história,tudo tende à uma obtusidade onde não há vencedores nem perdedores.Sobram apenas aquelas pessoas que se valeram de tudo para verem seus interesses serem alcançados.Podemos estar errados, mas a interrogação persistirá:por que querem tanto Battiste a ponto de desrespeitarem um país soberano e amigo?