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segunda-feira, 14 de abril de 2014

MARCO CIVIL. Se fosse bom para os internautas os políticos não aprovariam. jn

Marco Civil: se você está comemorando, é porque não leu o texto aprovado

Ou, claro, pode ser da militância que não contou a história toda, fingindo ser este um projeto bom para todos. Dica: para o usuário, é péssimo, mas para os "ciberativistas" pode dar ótimos negócios.


Texto a quatro mãos, com o amigo Penso Estranho.
marco civil Marco Civil: se você está comemorando, é porque não leu o texto aprovado
claro que todos eles querem sua liberdade, quem duvidaria disso?
Houve uma mobilização tremenda na web acerca do Marco Civil, verdadeira comoção internética para que todos apoiassem a aprovação do texto. Os partidos, de forma unânime, foram nessa onda. Ser contra esse texto – foi o que pareceu claro – seria como ser contra o país.
Bobagem. E vocês descobrirão a enrascada em que nos metemos. O lado ruim é ter de falar disso apenas DEPOIS do texto aprovado pela Câmara, mas a parte boa é que ainda passará pelo Senado. É preciso, desse modo, fazer pressão para que os senadores não entrem na conversa-mole.
Ou então, já que TODOS os partidos aprovaram, talvez para eles o Marco Civil seja um ótimo negócio. Ninguém estranhou que militância e parlamentares tivessem a mesma posição diante de um tema notadamente polêmico?
Mas vamos lá. E comecemos pela tão alardeada e comemorada “neutralidade da rede”, prevista no artigo nono e parágrafos:
Art. 9º O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação.
§ 1º A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de:
I – requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e
II – priorização a serviços de emergência.
§ 2º Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1º, o responsável mencionado no caput deve:
I – abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 do Código Civil
II – agir com proporcionalidade, transparência e isonomia;
III – informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e
IV– oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.
§ 3º Na provisão de conexão à Internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo. (em todas as transcrições do texto aprovado, os grifos são nossos)
Então não vai poder discriminar ou diminuir o tráfego? CLARO QUE VAI! Desde que isso seja avisado e pactuado pelas partes. O que, considerando todo nosso sistema jurídico, é algo não só legítimo como até mesmo óbvio (não seria cabível uma lei PROIBINDO duas partes de realizar um contrato dentro das regras constitucionais de negociação de serviços e preços).
Contratante e contratado, portanto, tem todo o direito de estabelecer as condições de sua relação. É plenamente razoável, especialmente em busca de ajustar preços e condições, que as partes discriminem algumas especificidades do serviço objeto do contrato.
Circulou pela web uma imagem pintando um quadro de terror caso o Marco Civil não fosse aprovado, pois sem ele as operadoras poderiam contratar planos específicos, inclusive indicando sites que teriam velocidades menores ou de acesso mediante pagamento extra (algo que até hoje nunca foi feito). Pois é justamente o texto aprovado pelo Marco Civil que REGULA e PERMITE isso. Sim, as operadoras podem, mediante contrato e seguindo os termos estabelecidos pelo artigo 9º e parágrafos, realizar essa discriminação nos serviços.
Ou a militância é excessivamente burra, ou não leu o texto aprovado ou tem a mais inescapável má-fé. Na prática, não mudou nada, pois o atual Código de Defesa do Consumidor já veda esse tipo de coisa (desde que não haja previsão em contrato).
Quanto ao mais, vale esclarecer: o CGI (Comitê Gestor de Internet) será “ouvido”, ou seja, terá função consultiva e não decisória (o que também é óbvio, mas a militância tenta passar ideias equivocadas acerca disso). Não haverá poder de veto nem nada do tipo. Na prática, trocam documentos de “sugestão” e fim de papo.
E essa consulta será feita quando da regulamentação da lei pela Presidência da República, ocasião em que serão dispostos os termos de PERMISSÃO da discriminação e diminuição da velocidade (ou seja, a não-neutralidade da lei mediante contrato). As operadoras, portanto, incluirão cláusula ou parágrafo explicando como isso se dará e tudo será permitidíssimo.
Também não contaram isso a vocês, né? Pois agora segurem o PACOTAÇO que vem de carona com a “neutralidade”.
As barbaridades já começam no segundo artigo do projeto de lei:
Art. 2º A disciplina do uso da Internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:
I – o reconhecimento da escala mundial da rede;
II – os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;
III – a pluralidade e a diversidade;
IV – a abertura e a colaboração;
V – a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e
VI – a finalidade social da rede.
A tara esquerdista pelos “direitos humanos” (não os reais, aqueles elencados na Declaração Universal da ONU, mas os que embasam a luta ideológica da esquerda e que excluem, entre outras categorias de seres humanos, os reaças, policiais etc.), pelo “exercício da cidadania” e pela “finalidade social” parece coisa inocente, mera perfumaria para agradar os corações mais sensíveis. Ledo engano.
Como não há letra morta na lei, essas expressões são o ponto de partida para movimentos sociais, ONGs defensoras de gêneros, etnias, orientações sexuais e “excluídos” em geral intentarem ações contra provedores, sites, blogs, perfis de redes sociais e qualquer outro gerador de conteúdo que, no entendimento desses grupos, não esteja usando a internet de acordo com tais diretrizes, agora expressas em lei.
A internet, que deveria ser uma ferramenta para o pleno exercício da liberdade de expressão, quando é “aprimorada” pelos progressistas mostra, já no início do seu “marco civil”, suas garras contra o que não seja o pensamento dominante.
Art. 10. A guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de Internet de que trata esta Lei, bem como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas, devem atender à preservação da intimidade, vida privada, honra e imagem das partes direta ou indiretamente envolvidas.
§ 1º O provedor responsável pela guarda somente será obrigado a disponibilizar os registros mencionados no caput, de forma autônoma ou associados a dados pessoais ou outras informações que possam contribuir para a identificação do usuário ou do terminal, mediante ordem judicial, na forma do disposto na Seção IV deste Capítulo, respeitado o disposto no artigo 7º.
§ 2º O conteúdo das comunicações privadas somente poderá ser disponibilizado mediante ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer, respeitado o disposto nos incisos II e III do art. 7º.
§ 3º O disposto no caput não impede o acesso, pelas autoridades administrativas que detenham competência legal para a sua requisição, aos dados cadastrais que informem qualificação pessoal, filiação e endereço, na forma da lei.
Quem pode sentir segurança quanto à inviolabilidade de seus dados diante de uma expressão tão genérica quanto “autoridades administrativas que detenham competência legal para sua requisição”? Agora, imaginem essa “autoridade administrativa”, que porventura considere seu blog, site, perfil de twitter ou facebook contrário à “finalidade social da rede”.
Esse cara aí, um progressista cheio de boas intenções provavelmente, pode solicitar SEM ORDEM JUDICIAL sua qualificação pessoal, filiação e endereço. Vejam como o Marco Civil avançou… direto na jugular da sua intimidade!
Art. 13. Na provisão de conexão à Internet, cabe ao administrador de sistema autônomo respectivo o dever de manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de um ano, nos termos do regulamento.
§ 1º A responsabilidade pela manutenção dos registros de conexão não poderá ser transferida a terceiros.
§ 2º A autoridade policial ou administrativa ou o Ministério Público poderá requerer cautelarmente que os registros de conexão sejam guardados por prazo superior ao previsto no caput.
§ 3º Na hipótese do § 2º, a autoridade requerente terá o prazo de sessenta dias, contados a partir do requerimento, para ingressar com o pedido de autorização judicial de acesso aos registros previstos no caput.
Não é da conta de ninguém quanto tempo você ficou conectado na internet, que horas você costuma acessar a rede, qual o IP utilizado, etc, etc… certo? Não era. Se antes o armazenamento desses dados dependia de uma autorização expressa e pessoal (aqueles termos e condições de uso que você escolheu não ler para acessar logo o site ou aplicativo), agora você não precisa mais se martirizar pela displicência. O Estado obrigará os provedores de sistemas a armazenar tudo, por um ano.
Com o Marco Civil, você não precisa mais ler e aceitar os termos de condições. O Estado já fez isso por você.
“Ah, mas é só armazenamento, ninguém vai acessar isso como bem entender e, ainda assim, é só por um ano”, dirão os “empreendedores esforçados”, que tanto comemoraram a aprovação do Marco. Seria, não fosse a possibilidade de extensão desse prazo, mediante requisição de “autoridade policial ou administrativa”. Qual autoridade administrativa? Perguntará o incauto. Aquela definida por um decreto ou portaria do executivo, fique tranquilo.
Art 15. O provedor de aplicações de Internet constituído na forma de pessoa jurídica, que exerça essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos, deverá manter os respectivos registros de acesso a aplicações de internet, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de seis meses, nos termos do regulamento.
§ 1º Ordem judicial poderá obrigar, por tempo certo, os provedores de aplicações de Internet que não estão sujeitos ao disposto no caput a guardarem registros de acesso a aplicações de Internet, desde que se tratem de registros relativos a fatos específicos em período determinado.
§ 2º A autoridade policial ou administrativa ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente a qualquer provedor de aplicações de Internet que os registros de acesso a aplicações de Internet sejam guardados, inclusive por prazo superior ao previsto no caput, observado o disposto nos §§ 3º e 4º do art. 13.
§ 3º Em qualquer hipótese, a disponibilização ao requerente, dos registros de que trata este artigo, deverá ser precedida de autorização judicial, conforme disposto na Seção IV deste Capítulo.
Os defensores mais extremados do marco civil, aqueles aferrados atavicamente à tutela estatal, ou mesmo aqueles que já vislumbram boas oportunidades (afinal, para dar conta destas novas obrigações e demandas, tanto as empresas quanto o poder público terão que contratar empresas, serviços, consultorias especializadas, adquirir novos equipamentos, enfim, uma rede de interesses e negócios nada neutra), ainda podem ter a cara de pau de dizer: “Ah, mas saber que horas eu acesso a internet ou quanto tempo eu fico conectado não me prejudica em nada”.
Então, o art. 15 veio para intervir e monitorar também o conteúdo de suas navegações, amigo internauta. Agora, todas as empresas provedoras de internet têm não só respaldo legal, mas a OBRIGAÇÃO de armazenar seu histórico de navegação por SEIS MESES. Pode apagar o histórico do seu navegador, abrir janela anônima, queridão, não vai adiantar. Seu provedor de internet não só estará guardando tudo (tudo bem, provavelmente ele já esteja fazendo isso hoje, graças ao “termo e condições de uso” que você não leu mas concordou), como estará amparado em lei para fazer isso.
As “autoridades policiais ou administrativas”, por seu turno, podem pedir a prorrogação desse prazo de armazenamento por mais tempo, caso você não esteja usando a internet para respeitar os direitos humanos ou desenvolver sua personalidade. Tudo feito com muita neutralidade…
Enfim
A essa altura, muitos de vocês não devem estar nada felizes com o texto aprovado. Na verdade, quase ninguém está. Vocês foram enganados e todos nós, gostando ou não do novo “Marco”, poderemos estar sob a tutela dessa péssima lei – caso seja aprovada pelo Senado.
Os felizes, raros, são aqueles que terão um novo mercado profissional com as obrigações geradas. Deixa eu adivinhar… Foram justamente eles que disseram ser essa uma boa lei, né? Dava para imaginar.
Para esses, o Marco Civil reservou um filé: recursos públicos. Vejam o que a Lei prevê como “Atuação do Poder Público
Art. 22. As iniciativas públicas de fomento à cultura digital e de promoção da Internet como ferramenta social devem:
I – promover a inclusão digital;
II – buscar reduzir as desigualdades, sobretudo entre as diferentes regiões do País, no acesso às tecnologias da informação e comunicação e no seu uso; e
III – fomentar a produção e circulação de conteúdo nacional.
Art. 23. O Estado deve, periodicamente, formular e fomentar estudos, bem como fixar metas, estratégias, planos e cronogramas referentes ao uso e desenvolvimento da Internet no País.
Sabem o que significa “promover a inclusão digital”? Num país com as ideias no lugar seria fomentar a concorrência para diminuir preços e melhorar qualidade de serviços, viabilizar infraestrutura de transmissão de dados, dar segurança jurídica para investimentos de longo prazo.
No Brasil, a expressão significa: grupos de estudos, seminários, debates, simpósios, cartilhas, capacitações, tudo devidamente custeado com dinheiro público para ensinar o “cidadão” a ser “digitalmente incluído” (sempre respeitando os direitos humanos e desenvolvendo sua personalidade, não podemos esquecer).
Esses dois artigos são sob medida para financiar mais um braço de doutrinação cultural, com o nome fantasia de “promoção da cidadania”.
Enfim, LEIA o projeto de lei aprovado pela Câmara, tire suas próprias conclusões, não caia na conversa dessa militância que se diz em favor de “direitos”, especialmente quando TODOS os partidos da Câmara concordam com essas “liberdades”.
Lembremos todos de fazer pressão quando o projeto chegar ao Senado. Em caso de dúvidas, peça para o militante que o convenceu a apoiar o Marco Civil que explique os artigos comentados neste post.
E espere sentado.

Correção: o leitor Rubens Bueno informa que o PPS votou contra – teria sido o único partido a votar dessa forma.