Páginas

sábado, 19 de setembro de 2009

Lula e a ética da conveniência


Em entrevista ao Valor, presidente diz não ter dúvidas de que manda no Brasil

Brasília (18) - O “companheiro-presidente” Luiz Inácio Lula da Silva revelou um lado autoritário, caudilhesco, na entrevista ao Valor Econômico na quinta-feira (17). Nela, assume, sozinho, a responsabilidade pela construção da refinaria Abreu e Lima (PE), em sociedade com o “compañero” Hugo Chávez. “Anuncia” ainda, uma “consolidação das leis sociais” e passa uma compostura na Vale do Rio Doce, como se ainda fosse propriedade estatal.

Justificando a decisão da construção da refinaria, afirmou: “Se dependesse da Petrobrás, ela não gosta de fazer refinarias.” E acrescentou: “Na lógica da Petrobrás, as suas refinarias já atendem a demanda. Há 20 anos a empresa não fazia uma nova refinaria.”

Lula só não revela as conseqüências das suas decisões.

Em depoimento à CPI, dois altos funcionários da Petrobrás admitiram falhas no projeto inicial. O gerente-geral de implementação de empreendimentos da obra, Glauco Legatti, contou que foi necessário refazer a previsão em relação ao solo da região. Segundo ele, "expansivo" .

Legatti e o gerente de custos e estimativas, Sérgio Santos Arantes, não conseguiram explicar como a obra vai saltar de R$ 10 bilhões para R$ 23 bilhões. A Abreu e Lima, lançada em 2005, está sob suspeita desde o ano passado, do Tribunal de Contas da União (TCU).

O TCU indica um sobrepreço de R$ 121 milhões em quatro contratos e acusa a empresa de sonegar documentos. O tribunal investiga superfaturamento nas indenizações por dias parados feitas pela Petrobras às empreiteiras, em até 930%. O empreendimento está em estágio inicial, mas a estatal já teria estourado o orçamento de R$ 93 milhões.

LEIS SOCIAIS

Na entrevista, o presidente anunciou que pretende mandar ao Congresso, talvez este ano, talvez no próximo - para criar mais um fato eleitoreiro - um projeto de lei para consolidar as políticas sociais de seu governo. Como fez o presidente Getúlio Vargas na década de 50, digno representante da escola caudilhesca gaúcha e que também sofreu mutações ao longo da vida política.

Não escondendo sua intenção de montar uma armadilha para a oposição, deixou no ar uma ameaça ao dizer que não vai pedir urgência para a tramitação desse projeto: “É bom mesmo que seja discutido no ano eleitoral.”

Lula quer vender a imagem de que foi ele o criador das políticas sociais e finge não saber que o Bolsa-Família é filho direto dos cinco mais importantes programas sociais do presidente Fernando Henrique Cardoso, do PSDB: o bolsa-escola, o bolsa-alimentação, o vale-gás, o programa de erradicação do trabalho infantil e o programa de apoio aos jovens em situação de risco.

Essa idéia presidencial pode deixar preocupados os trabalhadores e, principalmente, os setores mais pobres da população. Afinal, quando se instalou no Palácio do Planalto, Lula logo tratou de enviar ao Congresso um projeto de reforma da Previdência Social que era exatamente o contrário do que ele pregara durante a campanha eleitoral, atingindo aposentados e trabalhadores às vésperas da aposentadoria.

À época houve uma rebelião entre petistas e a então senadora Heloísa Helena e alguns deputados foram expulsos do partido.

Mais tarde num jantar com jornalistas, em fevereiro de 2004, Lula surpreendeu os convidados ao defender a extinção da multa de 40% sobre o saldo do FGTS nas demissões sem justa causa e admitir o parcelamento do 13º salário.

VALE

Ainda na entrevista, Lula finge esquecer que a Vale do Rio Doce foi “privatizada”, embora os fundos de pensão de algumas estatais sejam seus controladores, e se comporta como um bedel ao afirmar que “tenho cobrado sistematicamente da Vale a construção de usinas siderúrgicas no país. Todo mundo sabe o que a Vale representa para o Brasil. É uma empresa excepcional, mas não pode se dar ao luxo de exportar apenas minério de ferro.”

Como Lula se orgulha de não ler jornais, não deve saber que a Vale anunciou, em agosto, um investimento de US$ 3,7 bilhões na construção de uma siderúrgica no Pará. A Vale também confirmou a criação da Companhia Siderúrgica Ubu, em Anchieta (ES), com capacidade para produzir 5 milhões de toneladas de placas de aço – um investimento de US$ 3 bilhões e a criação de 3 mil empregos diretos.

Entretanto, adepto da ética da conveniência em relação à maior ou menor participação do Estado em empresas estatais, esqueceu de antecipar ao jornal o que hoje está em todos os demais: a participação do capitalismo internacional no Banco do Brasil, autorizada por decreto de sua autoria, vai passar para 20%.

Fonte: Agência Tucana 18 Set 2009 às 19:06:33