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sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Solteira, sem filhos. E daí?

22/10/2008

Marli Gonçalves

Dona Marta e sua gente, que me perdoem todos, mas diretamente desejo de coração que vocês todos sejam jogados na lata do lixo da história. E que suas cabecinhas falsas, perversas, atrasadas e ignorantes fiquem bem longe de nossa cidade. Vocês, Dona Marta e sua gente, estão querendo governar São Paulo? Deus nos livre de vocês, com esse pensamentinho barato, esse jeitinho comunista de ser que não resiste a um vento, essas balelas religiosas, esses estelionatos que estão praticando em todo o país.

Dona Marta e sua gente, vocês não mexeram só com os gays, ou os seus simpatizantes, o que já seria mais do que suficiente para afundá-los na lama. Vocês mexeram com os solteiros, sem filhos. Mexeram comigo. E com milhões de outras pessoas que são, sim, SOLTEIROS. E que não têm filhos, não! Vocês chamaram para a guerra – e como seus figadais inimigos – os solteiros, sem filhos. Somos muitos, Dona Marta, e somos poderosos! Porque vivemos para nós. Podemos ser gays. Podemos não ser. Podemos ter cachorro, gato, papagaio, beijá-los na boca, dormir com eles na cama. Podemos transar. Podemos nos manter sem transar. Podemos transar com um, com dois, com três. Podemos nos apaixonar. Sabia? Podemos até casar! E ter filhos... Ou adotar, ou cuidar dos filhos dos outros...

Olha, só, Dona Marta, podemos ter amantes! Não é muito mais divertido?

Está com inveja? Saiba, Dona Marta e sua gente, que há muitos de nós! Sabe que somos muito bem requisitados e valorizados no trabalho? Que nossas casas são mais bonitas? Que gastamos melhor nosso dinheiro? Que somos mais responsáveis, carinhosos e ligados aos nossos amigos e familiares? Por um acaso, Dona Marta, sabe que somos a cara da cidade que a senhora ousa se recandidatar a governar?

Que papelão, que nojo. Quem são vocês, Dona Marta e sua gente, para ousar questionar essa opção? Vocês têm alguma idéia de como é, para nós, importante, poder responder orgulhosamente: Solteiros, sem filhos. Imaginam o que eu, mulher, solteira (embora com muitos casamentos sem papel) já passei, encontrando nesses meus 50 anos de vida, gentinha como vocês? Gentinha que considera, no fundo de suas pequenas almas, que somos gente de “segunda categoria”, ou que – nossa! – por não sermos casados, somos “gays”? Cansei e canso de ouvir insinuações, em geral veladas. “Humm... Ela deve ser sapatão!”

Sou não, Dona Marta. Mas nem eu nem o prefeito Kassab, nem nenhum de nós, lhe deve satisfações sobre para quem damos, se comemos ou somos comidos, se fazemos sexo com homens, mulheres, ou ambos.

Não, Dona Marta e sua gente: somos livres! Eu, por exemplo, não tenho que agüentar um marido argentino rabo de saia ou um senador idiota ilustre por anos para dizer que tenho alguém. Eu não tenho que sorrir em festas infantis, muito menos ver meus lindos filhinhos virando pseudopunks ou sambistas chatos e sem noção. Mais: eu não tenho que a qualquer preço vender a minha biografia ou tentar mudar minha cara e minha personalidade. Dona Marta, a quem a senhora pretende enganar tentando parecer a Luiza Erundina? Ficou igual à Vovó Donalda, Dona Marta, olhe bem no espelho. Porque a Luiza Erundina, Dona Marta, que deveria estar muito envergonhada de estar do seu lado, nunca teve problemas em dizer que era solteira, sem filhos. Governou a cidade, foi muito querida, e só se atrapalhou mesmo quando essa sua corja petista começou a meter a mão na cumbuca.

Como vocês ousam fazer essa pergunta ao prefeito Kassab? Sim, eu respondo por ele: é solteiro, sem filhos; ouvi dizer que tem um gato de estimação. Mas Kassab tem uma família; todos com uma história construtiva, muitos engenheiros, gente do bem, Dona Marta! Irmãos, que o querem muito bem, com certeza. Cuida do pai, cuidou da mãe, vive feliz, seus olhos brilham e ele gosta de trabalhar pela cidade. A senhora pode dizer que tem uma família? Cadê? Mostra aquela foto da sua família! Aparece com o Luis Favre! Apresente-o para a gente! Não me faça rir. Mas, por favor, chega, não me faça querer xingá-la, como é o pensamento que tenho agora. Me deixe simplesmente esquecê-la, ou lembrar apenas de seus melhores momentos. Olha que já está ficando difícil lembrar dessa parte de sua biografia.

Vamos falar sério, Dona Marta e sua gente: podemos começar com Celso Daniel. Que tal? Não, não quero saber de nada de crime de Santo André. Quero saber como é que vocês conseguem dormir depois de, por causa do preconceito, há exatos 6 anos fazer de tudo para que a verdade mais clara do mundo a respeito de Celso Daniel (e verdade com a qual ele lidou numa boa) não aflorasse? Petista não pode ser veado, né? Pode, sim!

A senhora e sua gente acha mesmo que levantou alguma suspeita sobre o prefeito Kassab? Ora, seu filhinho Suplinha pula dali, pula daqui... e não é que ele é solteiro, sem filhos? Será gay? Será por isso que ele usa aquelas tachas na roupa, pinta o cabelo, faz cara de mau? Lá pelos lados do Palácio do Planalto tem outras pessoas assim, hein? Solteiras, sem filhos! Quer que eu lembre de algumas ou não precisa?

Dona Marta, que vergonha, que papelão! A gente não lutou tanto tempo, não morreu brigando, foi torturado, batalhou tanto para a senhora e sua gente vir agora mexer com uma coisa tão importante como é a liberdade individual. Dispensamos e desprezamos gente como você, e como o Eduardo Paes, esse simplesmente um moleque safado, que deveria ir, logo, para o PT.

Marli Gonçalves, jornalista, 50 anos, solteira, sem filhos. E não é gay!