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segunda-feira, 13 de outubro de 2008

PRÉ-SAL (1A)


                                                       Entrega o deserto a certa gente e, em pouco tempo faltará areia.                                                           

  Aforismo árabe

 

Ternuma Regional Brasília

 

Agnaldo Del Nero Augusto -General  de  Divisão  Reformado

 

A descoberta de imensas reservas de petróleo na costa brasileira é motivo de regozijo para todos nós brasileiros.

Hoje nossas reservas são estimadas em 14 bilhões de barris. Confirmada a projeção do potencial do pré-sal, elas se elevariam para 55 bilhões de barris e o Brasil passaria da 24a  para  a 12a  posição entre as maiores reservas mundiais. Somando o potencial de descobertas de até 20 bilhões de barris no pós-sal, assim denominando as reserva acima da camada de sal, a serem confirmadas, as reservas brasileiras poderiam superar os 70 bilhões de barris, nivelando-se às dos sete maiores países produtores mundiais de petróleo.

      Ainda existem dúvidas quanto ao tamanho total dessas reservas. As reservas do pré-sal se estenderiam do Espírito Santo a Santa Catarina, numa extensão de cerca de 800 km e não estão avaliadas na sua totalidade. Podem se estender para o Norte, até Alagoas ou Sergipe.

      A exploração dessas reservas é um problema complexo. Técnico, político e mesmo ideológico, nesta infeliz latino-américa de hoje.

      Apresenta dificuldades técnicas em razão das altas pressões e temperaturas, abaixo da espessa camada de sal, o que não é novidade. Há vinte e dois anos a Petrobrás lida, especificamente, com esse problema e já perfurou mais de uma dezena de poços nessa área e adquiriu capacidade tecnológica para conduzir essa exploração, apesar das dificuldades que realmente apresenta.  Das áreas antes licitadas, cerca de 25% estavam incluídas na região do pré-sal, mas nenhuma das grandes empresas petrolíferas se interessou por elas, por lhes faltar capacidade tecnológica. Capacidade que não detêm, inclusive em águas profundas, em que o Centro de Pesquisa da Petrobrás é referência mundial de excelência. Está habilitado a coordenar o desenvolvimento de projetos e novas tecnologias para contornar os óbices do pré-sal. Na maioria das outras áreas licitadas, as grandes empresas buscam associar-se à Petrobrás, que retém essa capacidade, além de prospecções e informações de nossa plataforma continental.

      Outro problema para a exploração dessa riqueza, talvez mais difícil de ser contornado que o tecnológico, é o seu custo considerável e o desafio de obter os investimentos necessários. Ilan Golfjan, em recente artigo no O ESP, considerou que requererá um montante de investimentos “nunca antes imaginados”. Cita como uma estimativa disponível a do Departamento de Pesquisa do banco suíço URS, na sua publicação Global Equity Research Q-série: Global Oil Services, de 8 de maio último, baseada em análises de especialistas da indústria. O URS estima que o custo da operação das novas descobertas do Brasil será em torno de US$ 600 bilhões para produzir 50 bilhões de barris. Isto é, cerca de 38% de nosso Produto Interno Bruto. Um terço de tudo que o país produz ao longo de um ano.  Esse mesmo jornal, sem nomear o banco, que pode ser o mesmo antes citado, estimou que o custo de exploração e produção da área do pré-sal, na Bacia de Santos variará de US$ 635 a US$1,3 bilhões, a ser despendido ao longo de uma década. É muito dinheiro, mesmo considerando o período de sua aplicação. A Petrobrás considera que o valor poderá aproximar-se dos 600 bilhões de dólares, mas para explorar as áreas já licitadas em que é a operadora: Tupi e Iara, Bem-Te-Vi, Carioca e Guará, Parati, Júpiter e Caramba.  Não há estimativa sobre o custo do estabelecimento da cadeia produtiva para transformar o óleo em produtos refinados e petroquímicos, para que o País não seja um mero exportador da commodity energética.

O agravamento da crise do sistema financeiro internacional, de extensão ainda não definida, dificultará enormemente a obtenção de financiamentos e investimentos  externos por um período, também, desconhecido.  O secretário-geral da Unctad, órgão da ONU para o Desenvolvimento e Comércio estima que os investimentos externos tenham uma queda de 20% em relação ao montante de 2007. Sem financiamento, o petróleo que se formou há 150 milhões de anos , ou coisa que o valha, continuará depositado abaixo da camada de sal. Debaixo da água e do sal, petróleo e gás são recursos naturais, não riquezas de fato.

       Mesmo que as reservas anunciadas sejam bem menores que o previsto e que uma parte razoável do custo possa ser financiada com a própria venda do petróleo que for sendo extraído, está claro que haverá a necessidade de um considerável investimento em um futuro próximo.

       Somente a Petrobrás, que esperamos deverá continuar sendo o ator operacional mais importante nessa empreitada, associada a outras empresas, precisa para o pré-sal de dezenas de petroleiros, centenas de barcos de apoio e até duas dezenas de plataformas de produção. A definição dessa demanda futura possibilitará investimentos privados, nacionais e internacionais, em território brasileiro. Isso provocará investimentos e emprego de qualidade.

        A indústria do petróleo não é apenas produtora de combustíveis e lubrificantes. Constitui a base de indústria química e petroquímica de enormes proporções. É difícil imaginar algum produto de consumo em que a indústria química não esteja presente de alguma forma, da água potável aos fertilizantes e defensivos. Está presente em todos os medicamentos modernos, nos desinfetantes, nos detergentes, nas tintas, nos têxteis e, mais especificamente, na petroquímica, nos plásticos e fibras sintéticas.

    A indústria química é área chave para o desenvolvimento.  A falta de matéria prima não permitiu que essa indústria prosperasse tanto quanto outros segmentos no nosso país. Hoje importamos o dobro do que exportamos nessa área, com um déficit de 13 bilhões de dólares.

    A constatação de mais essa dádiva da natureza, um dos poucos recursos naturais que faltava para que o Brasil se tornasse a potência que seus recursos naturais indicavam seria um dia, agora pode ser vislumbrada com maior clareza. É mais uma oportunidade extraordinária para nosso futuro que não pode ser desperdiçada. O desafio maior é transformar esses futuros recursos num dos eixos de projeto de desenvolvimento. Eles são importantes para ajudar a estruturação de uma política e estratégia nacional de desenvolvimento. Política e estratégia que, até hoje, não vimos delineadas, por esse governo.

    O presidente Lula tem toda razão de estar contente, feliz mesmo, por essa descoberta vir a ser confirmada no seu governo. Nenhum dos recentes ex-presidentes deixaria, inclusive de explorar politicamente essa dádiva. Numa de suas costumeiras bravatas, disse entre outras que esse petróleo não pertence à Petrobrás. Essa afirmação pode ser tomada em vários sentidos, o verdadeiro é sempre subjacente. Ele não diz nada de graça.  Dizemos nós, não pertence à Petrobrás, mas, também, não pertence ao governo petista. Pertence ao Estado nacional e este, juntamente com a sociedade, tem a obrigação de estar no centro das discussões que devem ocorrer na definição dessa importantíssima questão.

    Por hoje ficamos por aqui, mas continuaremos, com nossos limitados conhecimentos da área, a indicar alguns pontos que julgamos devem ser objeto dessa discussão e quem pode conduzi-la. Desde já, todos estão convidados a refletir sobre esse importante problema e colaborar na indicação das questões que devem ser objeto de uma ampla discussão.