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quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Brasil obsoleto e vizinhos armados

EDITORIAL
Jornal do Brasil
2/1/2008
A operação de resgate dos reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), apesar do malogro, pôs em evidência a intensa cooperação entre o governo Hugo Chávez, na Venezuela, e a guerrilha. Não bastassem as operações militares na região de Essequibo, nas Guianas, o presidente venezuelano, que se autodefine como um bolivariano, moderniza o potencial bélico de suas Forças Armadas, municia os narcoguerrilheiros das Farc e faz vista grossa à proteção de seus oficiais militares a acampamentos do grupo de oposição ao governo de Álvaro Uribe.
Enquanto Chávez amplia sua influência bélica nas regiões fronteiriças com a Guiana, a Colômbia e o Brasil, as Forças Armadas daqui sobrevivem na penúria. O quadro traçado por extensa reportagem de Fernando Exman, publicada domingo pelo Jornal do Brasil, sugere a urgência do reaparelhamento de Exército, Marinha e Aeronáutica, não apenas para manter o equilíbrio geopolítico na América do Sul mas especialmente para ampliar a proteção ao longo dos limites geográficos do país.
Enquanto a Venezuela desembolsou milhões e milhões de petrodólares para a aquisição de fuzis, aviões de transporte, caças e embarcações ultramodernos, o Chile atualizou sua Força Aérea e a Colômbia mantém seu arsenal com a ajuda americana, o corte de verbas no Orçamento deste ano é ameaça real para o Brasil desde que em dezembro foi derrotada no Senado a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira.
Em princípio, Exército, Marinha e Aeronáutica haviam assegurado R$ 9 bilhões para custeio e investimento neste ano. Embora nem todo o dinheiro orçado fosse efetivamente empenhado, o valor dera alento aos militares das três Forças, que já definiam prioridades para a compra de equipamentos. A ameaça de corte, contudo, colocou-os de prontidão. Os oficiais temem não apenas o abandono dos planos mas, especialmente, o avanço da insatisfação na tropa com a defasagem dos soldos. Além disso, a falta de recursos para a manutenção de equipamentos produziu uma geração de soldados, marinheiros e aspirantes com formação deficiente.
Militares bem aparelhados e bem pagos são essenciais para desencorajar qualquer tipo de agressão militar, observa o comandante do Exército, general Enzo Martins Peri. "A estratégia de dissuasão depende da manutenção de forças suficientemente poderosas e aptas ao emprego imediato", avalia. "Tivemos uma perda de nossa capacidade dissuasória".
O levantamento do arsenal brasileiro confirma a análise do comandante. A artilharia do Exército brasileiro é herança da Segunda Guerra Mundial. Blindados têm mais de 30 anos em atividade, fuzis 42 anos de uso, mais da metade das viaturas já chegaram aos 20 anos de estrada. Faltam equipamentos para hospitais de campanha e de comunicações, armamento e munições, embarcações, pontes flutuantes, mísseis anticarro e materiais para batalhões de construção e engenharia.
Na Marinha, o quadro não difere muito. Entre 1999 e 2006, foram desativados 21 navios e seis aviões, e apenas 10 navios se incorporaram à frota. Há embarcações, submarinos e helicópteros parados por falta de condições. Outros operam com restrições. O almirante Júlio Soares de Moura Neto, comandante da Força, adverte para a vulnerabilidade do Brasil nos campos marítimos de exportação e exploração de petróleo, além da redução das ações de prevenção da poluição das águas e de combate a crimes.
A Aeronáutica, mais cautelosa em listar suas carências, aguarda recursos para modernizar 46 caças com a última geração de radar, para equipamentos de reabastecimento em vôo, mísseis e bombas guiadas a laser. Mas a atualização de outros 53 caças com mísseis antinavio e operação a baixa altitude. Fora a compra de Mirage 2000-C, Supertucanos, helicópteros e aviões de patrulha P-3.
Enquanto os vizinhos se armam, o Brasil relega a segundo plano a modernização das Forças Armadas. Entra governo, sai governo, verbas para a preservação da segurança nacional são cortadas, contingenciadas ou adiadas. Não dá para esperar uma demonstração prática do arsenal dos parceiros do Sul.

É preciso investir já